sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Nota em apoio às reformulações propostas pela Tatukada e em apoio à nota do coletivo Mietta Santhiago



A TATUKADA formou-se, há alguns anos, como o grupo que reivindicava a qualidade de ser a bateria do curso de direito da UEL. É inquestionável que, atualmente, não apenas os estudantes do curso possuem tal referência, mas também a comunidade externa vem expressando o reconhecimento do grupo de diversas maneiras.


Já passava da hora, portanto, de se colocar em discussão a dimensão ideológica presente nas letras de suas músicas.


O grupo de estudantes LUTAS LONDRINA, por meio desta nota, manifesta apoio à atitude da diretoria da Tatukada em propor que “novos hinos serão produzidos, e aqueles que tenham qualquer teor discriminatório serão refeitos e refletidos”.


Não se trata de mudança simplória. É preciso que nos conscientizemos de que qualquer brincadeirinha, por mais despretensiosa ou pueril, ao rebaixar a condição do outro por condições de classe, gênero, cor ou orientação sexual, torna-se uma grande violência. De pouco em pouco, uma criança repete o vocativo “veado” tantas vezes para rebaixar seus colegas que, mesmo sem pensar diretamente no sentido da palavra, legitima a homofobia. É preciso refletir antes de fazer tais “brincadeirinhas”, levando em consideração todo o contexto social que envolve tornar uma adjetivação pejorativa.


Durante todos seus anos de existência até agora, diversas músicas da TATUKADA foram colocadas de maneira a contribuir para a legitimação do patriarcado vigente. Quem serão as “danadas”, as “putas graduadas”, “calouras puquianas” etc. dos cursos de direito? Tudo pode parecer muito engraçado para um primeiro-anista. Mas é preciso que avancemos e percebamos qual é a seriedade de discursos machistas serem entoados como hinos do curso. Muitos aqui conhecem ou já presenciaram situações de estupro ou de alusão a estupro ocorridas em festas universitárias. Não tratemos, portanto, desse tema com um apego sentimental à história particular que cada um possa ter vivido ao longo da faculdade. Devemos enfrentá-lo com a seriedade que lhe é devida. Vivemos em uma sociedade patriarcal que oprime, estupra e mata. Qualquer discurso que a legitime possui evidente relação de causalidade com suas desumanidades. Eis o que, ao apoiarmos e defendermos a atitude da TATUKADA, não podemos esquecer.


Manifestamos, por todos os motivos expostos, nosso apoio às reformulações propostas pela diretoria da TATUKADA.


Ressalvamos, entretanto, a necessidade de se aprofundar ainda mais o debate político que envolve a bateria do nosso curso. Nesse sentido, consideramos essencial questionar também a matriz discriminatória da totalidade social que a envolve, ou seja, a competitividade e a individualidade como paradigmas que regem a convivência universitária. Nossa esperança, portanto, é que as mudanças continuem a ocorrer. Para além da reformulação de suas letras, que a bateria universitária possa atuar na ruptura do vigente sistema de competição baseado no ufanismo, na construção de adversários e na sacralização do individual, valores esses opostos à comunhão entre coletividades.


O grupo de estudantes LUTAS LONDRINA manifesta também, com especial admiração pela luta de todas mulheres deste curso, apoio à nota do COLETIVO MIETTA SANTHIAGO (transcrição abaixo). Mudanças sociais como essas não podem ser vistas como mera boa vontade daqueles que detêm poder simbólico. Trata-se, acima de tudo, do reflexo de anos de luta contra a opressão. Todo apoio ao coletivo Mietta Santhiago e à sua luta feminista, pois não há dúvidas que foram e serão protagonistas de diversos avanços sociais no sentido da emancipação social!


Por fim, colocar esse tema em debate no âmbito de nosso curso demonstra que, cada vez mais, a sociedade de classe, patriarcal, machista e homofóbica se desnuda. Há, ainda, muito que se lutar e toda uma sociedade para se transformar. Mas a luta também se faz aos poucos, em pequenos espaços e todos os dias. Com mudanças como essas, avançamos para a conquista de um sentido mais humano de sociabilidade.

A esperança se renova.





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NOTA DO MIETTA SANTIAGO – COLETIVO DE MULHERES DO DIREITO – UEL
Com grande surpresa e satisfação, nós, mulheres do Mietta Santiago - Coletivo de Mulheres do Direito UEL, viemos, por meio desta, declarar apoio à nota emitida pela Tatukada, bateria de nosso curso, no sentido de que os hinos, de cunho discriminatório, venham a ser repensados e discutidos. A bateria possui o papel de representar e impulsionar o curso de Direito da UEL. Essa é uma função importantíssima e delicada, que pode tanto colaborar para a integração dos graduandos quanto incentivar a discriminação e a hierarquização dentro da comunidade universitária. A Tatukada se apresenta em diversos eventos do curso e é, muitas vezes, o primeiro contato que uma aluna ou aluno possuem com o curso. Tem papel fundamental, portanto, na construção dos alunos do Direito - UEL. É importante, destarte, que haja uma preocupação com as letras ecoadas em seus hinos, vez que a bateria deve representar a diversidade existente entre as alunas e os alunos. Sabemos da dificuldade em se discutir temas de lutas sociais em um curso tão conservador, porém, um passo ainda que pequeno já se mostra de extrema importância na busca pela igualdade. Como mulheres graduandas do curso do Direito UEL, registramos aqui nossa indignação diante da forma como a mulher, ou “puta graduada”, vem sendo representada. Dessa maneira, compreendemos ser fundamental, em ocasião de rediscussão das letras das músicas que representam nosso curso, que a posição ocupada pela figura feminina nos discursos do Direito UEL seja revista. É importante notar que o discurso que vinha sendo reproduzido nas citadas músicas, apenas reflete a violência e opressão que nós, mulheres, enfrentamos no dia-a-dia. A nova postura da Tatukada, nesse sentido, é uma oportunidade para promover o rompimento do ciclo de incitação à opressão contra à mulher, ao menos no seio universitário. Liberdade de expressão não pode e nem deve ser confundido com abertura para discursos de intolerância e discriminação. É necessário que antes de se clamar por igualdade e justiça na sociedade, comecemos por problematizar ações simples do nosso cotidiano, que de tão repetidas nos pareçam naturais. A dificuldade de se quebrar paradigmas e mudar conceitos estipulados há muitos anos, mostra claramente o motivo e importância de tais lutas em âmbito acadêmico. Banir racismo, machismo, homofobia e qualquer tipo de discriminação em um ambiente tão plural como o Direito UEL faz-se extremamente necessário para a construção de uma universidade formadora por pessoas com maior capacidade critica e consciência de justiça social. Entendemos que a Tatukada deve representar toda a gama de pessoas do curso. Assim sendo, pensamos ser importante que as letras sejam escritas de forma coletiva, ouvindo as minorias do Direito – UEL. Dessa forma, o Mietta Santiago, Coletivo de Mulheres do Direito – UEL, deseja ajudar nesse passo a ser dado pela bateria, atuando conjuntamente no processo de criação e alteração das músicas da Tatukada. É com grande felicidade que encerramos esta carta.
MIETTA SANTIAGO - COLETIVO DE MULHERES DO DIREITO-UEL
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